- Capítulo Inicial - Livro Digital - Prefácio, Prólogo e Introdução
- Capítulo 01 - A Bola e os Campinhos de Futebol
- Capítulo 02-O Nosso Campinho de Futebol
- Capítulo 03-Futebol-Time Barcelona Jardim Seckler
- Capítulo 04 - Malharia Mundial
- Capítulo 05-Futebol-Time Flor da Vila
- Capítulo 06- Educação - As Escolas
- Capítulo 07 - O Bairro São João Clímaco
- Capítulo 08 - O Enigmático Túnel
- Capítulo 09 - A Fazendinha
- Capítulo 10 - Cláudio Bardu e a Noruega
- Capítulo 11 - Cláudio Bardu no Japão
- Capítulo 12 - A Menina da Janela
- Capítulo 13- Brincadeiras da Infância
- Capítulo 14 - A Televisão e as Novas Brincadeiras
- Capítulo 15- As Turmas e suas Vilas
- Capítulo 16 - O Campinho de Futebol da Rua Anny
- Capítulo 17- O Samba de Gafieira
- Capítulo 18-Anos Dourados e Jovem Guarda
- Capítulo 19-A Árvore das lágrimas
- Capítulo 20 - A Padaria 7 Centos
- Capítulo 21 - Mansão da Libertação
- Capítulo 22 - Futebol Bairro São João Clímaco
- Capítulo 23 - Futebol Anos 50/60/70/80
- Capítulo 24 - Futebol no Areião
- Capítulo 25-Espaço Chuá Chuá e os Anjos de 4 patas
- Capítulo 26 - A Corrida Maluca
- Capítulo 27 - A Lagoa Azul da Paramount
- Capítulo 28 - A Linha de Tiro
- Capítulo 29 - O Canavial do Nias
- Capítulo 30 - A Bola Rolando e os Curiós Cantando
- Capítulo 31 - Serviço Militar
- Capítulo 32 - Os Cinemas e os Salões de Diversões
- Capítulo 33 - Os Circos e Parques de Diversões
- Capítulo 34 - A Menina do Abacateiro
- Capítulo 35 - A Menina do Muro
- Capítulo 36 - É uma Casa Portuguesa, com Certeza !
- Capítulo 37-O Médico Veterinário e seu Cão Carrão
- Capítulo 38 - As Lágrimas de um Cavalo
- Capítulo 39 - PÁGINA DOURADA
- Capítulo 40 - PÁGINA DE OURO
- Capítulo 41-Motociclismo-Infinito Entre Duas Rodas
- Capítulo 42 - Talentos Literários
- Capítulo 43 - Amigos para Sempre
- Livro Digital - Página Final
- Contatos
Capítulo 19 - Lembranças da Nossa História
A ÁRVORE DAS LÁGRIMAS
PORTAL DO IPIRANGA
Árvore das Lágrimas
Não se sabe quem a plantou, nem quando. Uma das referências mais antigas é do viajante Emilio Zaluhar, em seu livro Peregrinação pela Província de São Paulo, publicado em 1862:
A centenária Árvore das Lágrimas, uma frondosa figueira da espécie benjamina, situada na Capital de São Paulo, Brasil, na altura dos números 515 e 535 da Estrada das Lágrimas, é ainda hoje conhecida nas imediações dos bairros do Sacoman e do Ipiranga, mas pouco familiar aos paulistanos em geral.
"Pouco mais adiante do Ipiranga encontra-se uma belíssima figueira brava, cujos galhos bracejando em sanefas de verdura, formam um bonito dossel em toda a largura da estrada (“Caminho do Mar”). É este o sítio das despedidas saudosas. Aqui vêm abraçar-se, e jurar eterna amizade, aqueles que se separam para, em opostas direções da estrada, seguirem depois, e quantas vezes na vida, um caminho e um destino também diverso."
A figueira ocupava um ponto estratégico em São Paulo no século XIX. Marcava o limite da cidade, onde se encontravam as últimas casas e começava a estrada de terra que levava ao litoral, o Caminho do Mar. Até aquele ponto, os viajantes eram acompanhados em comitiva, para as despedidas junto ao início da estrada. Ali também eram decerto recepcionados os que retornavam a São Paulo. Conta-se que a árvore foi marco de despedida de expedições para a Guerra do Paraguai (1865 – 1870). Os familiares dos voluntários que partiam para a luta podiam acompanhá-los somente até a frondosa figueira.
Com a construção da São Paulo Railway em 1867, as viagens a cavalo ou carruagem pelo antigo Caminho do Mar foram lentamente substituídas pelo trem e o local preferido para as despedidas e recepções tornou-se a plataforma da Estação da Luz. Aos poucos, a Árvore das Lágrimas foi perdendo seu significado emocional e simbólico. Até que, em 1909, o proprietário do terreno tentou derrubá-la.
O jornal O Estado de S.Paulo deu destaque ao fato, mobilizou a opinião pública e o terreno acabou sendo doado à municipalidade.
O prefeito Firmiano Pinto, em 1920, mandou construir uma mureta com grades ao redor da figueira para protegê-la, onde afixou uma placa de bronze, com um poema de Eugênio Egas, que se conserva até hoje:
Sou a árvore das lágrimas
e das saudades.
Sob a minha sombra
corações sem número
separaram-se aflitos.
[...]
Vi e admirei,
vejo e admiro,
hei de ver e admirar,
a vertiginosa marcha triunfal
do progresso paulistano.
Viajante que me contemplas,descobre-te!
Ao longo do século XX, a velha figueira foi celebrada de diversas formas. Ela foi tema do pintor Oscar Pereira da Silva numa tela de 1936, intitulada “A Árvore das Lágrimas”, pela qual recebeu o Prêmio Histórico da Prefeitura de São Paulo. No Dia da Árvore de 1952, a Sociedade Geográfica Brasileira homenageou-a com a inauguração de mais uma placa de bronze, desta vez afixada no próprio tronco, com os dizeres:
Esta árvore não pode ser tocada. Foi semente, embrião de monstro. Alma latente, na terra a germinar. Aspirando num sonho obscuro, vagamente, ao Infinito, à Vida, à Luz Vermelha, ao Ar. (Guerra Junqueiro. São Paulo, Brasil, 1952).
Durante os festejos pelo IV Centenário da Cidade de São Paulo, em 1954, a árvore voltou a ser lembrada e incluída em alguns roteiros turísticos. Nos anos 80, foi relacionada entre a Vegetação Significativa no Município de São Paulo, por iniciativa da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, tendo o seu corte proibido.
Com o crescimento da cidade, o traçado do Caminho do Mar integrou-se à malha viária urbana, recebendo a denominação de Estrada das Lágrimas no trecho onde se ergue a figueira. Alheia à passagem do tempo, a árvore se integrou à nova paisagem e continua a guardar as chegadas e partidas cotidianas, agora dos carros, ônibus e caminhões que passam apressados.
Texto de José de Souza Martins do Jornal O Estado de S.Paulo de 30 de agosto de 2010 às 00h00
A Árvore das Lágrimas
Texto de José de Souza Martins do Jornal O Estado de S.Paulo de 30 de agosto de 2010 às 00h00
É muito triste vê-la assim, sozinha e solitária, velhinha, à beira do caminho, sem o afago da brisa do campo nem a mansa ternura da garoa de seus tempos de juventude. Já não há poetas que lhe dediquem versos, nem jovens estudantes que a cortejem. Ou velhos viajantes que a visitem para um dedo de prosa. Ou tropeiros que lhe contemplem a beleza numa tarde de sol. Sobretudo, já não há lágrimas que lhe reguem as raízes. Todos passaram e se foram, todos partiram sem dizer adeus. Foram muitos os anos em que os que vinham de longe, ou para longe iam, ansiavam por vê-la na curva do caminho antigo.
Era ali que todos se davam conta de que o passo adiante era possível, o longe era perto, na sacramental sombra da antecipação da chegada e do ir adiante. Lugar de pouso e de repouso. Lugar de espera e de esperança.
Danton Vampré, acadêmico de Direito, poeta e teatrólogo, dedicou-lhe enternecido poema há 100 anos, no começo do século 20:
"Árvore dos prantos, árvore esquecida, tão formosa foste, quão velhinha estás! És como uma branca e solitária ermida, cujos crentes foram-se através da vida, sem voltar os olhos tristes para trás." Outros admiradores, muito antes, sobre ela deixaram notas e afagos, como A. Emílio Zaluar que ali descansou, em 1861, a caminho de Santos: "Pouco mais adiante de Ipiranga, encontra-se uma belíssima figueira brava, cujos galhos, bracejando em sanefas de verdura, formam um dossel em toda a largura da estrada. É este o sítio das despedidas saudosas. Aqui vêm abraçar-se e jurar eterna amizade aqueles que se separam, para em opostas direções da estrada seguirem depois, e quantas vezes na vida, um caminho e um destino também diversos."
Montado numa impolítica mula, afeita às durezas da subida da Serra do Mar, mas roceiramente avessa aos atropelos e pressas da história, sob a galhada da figueira passou o príncipe d. Pedro, para alcançar, pouco adiante, e alguns minutos depois, a guarda de honra que o acompanhara desde Santos e se adiantara. Era a tarde de 7 de setembro de 1822.
Nem o príncipe nem a mula estavam preparados para o inesperado do que aconteceria às margens do Ipiranga dali a pouco. Pedro Américo substituiu a mulinha simples e trabalhadeira, em seu quadro celebrativo do acontecimento, Independência ou Morte, por um majestoso cavalo castanho, próprio para aquele grande ato de nosso destino. Do mesmo modo como se imaginava o povo, a mula que carregava o príncipe não se prestava para carregar a história.
A velha árvore sobrevive, ao lado de um ponto de ônibus, na Estrada das Lágrimas, vizinha à casa n.º 515. Acabou abraçada e sufocada pelo crescimento urbano anômalo, no flanco da favela de Heliópolis, como incômodo vegetal atravancando o trânsito. Em agonia lenta, a vergonhosa agonia de nossa memória histórica.
Nome completo: Danton Vampré
Pseudônimo(s): Mário da Luz, Tito Lívio
Informações sobre o autor
• Nascimento: 1892 - Rio Claro, SP
• Morte: 1949 - São Paulo, SP
• Descrição: Poeta, teatrólogo, jornalista, advogado (1921).
• Fonte(s) dos dados:
o COUTINHO, Afrânio; SOUSA, José Galante de. Enciclopédia de literatura brasileira. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional; Academia Brasileira de Letras, 2001. 2 v. ISBN 8526007238
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